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quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

O lado babaca da psicologia - teoria e prática.




Então que hoje a culpa cristã venceu e eu fui para a faculdade ter meu primeiro dia de aula. Teoricamente, eu deveria estar fazendo TCC e ficando neurótica com o processo de sedução de um orientador, escolha de uma linha teórica, de um tema e de qualquer coisa implicada com bancas e bacharelados, o que totalmente não é o meu caso.
Fazendo o que eu sei de melhor, ou seja, sendo irracional, eu resolvi pagar todas as matérias que eu devia nesse semestre e minha grade semestral definitivamente está living la vida loca. Ainda que na teoria, eu seja sexto semestre, numa sala no segundo andar com meus colegas de sempre, na prática, eu sou terceiro semestre numa sala no primeiro andar com uns calouros, sexto semestre no segundo andar e nono semestre no terceiro andar com o povo já sem muito saco para a faculdade e os textos exigidos (hello, depois de quatro anos e meio de faculdade, quem pode condená-los?) e, parando pra pensar nisso hoje durante a aula de uma matéria que eu devia, percebi o quanto vai ser bom para as minhas pernas essa sequência de escadas e o quanto vai ser bom para a minha mente essa coisa de pegar matérias em semestres tão abissalmente diferentes e analisei as repercussões.
Talvez pessoas que não façam psicologia achem que os aspirantes a psicólogos são todos seres maravilhosos que querem ajudar o próximo. Infelizmente, minha observação displicente me faz crer que não é bem assim. A psicologia é uma árvore cheia de ramos ( o que talvez os alunos do terceiro semestre não saibam porque não viram nem metade das possibilidades ainda, e o que talvez os alunos do nono semestre já nem queiram mais saber, afinal eles já escolheram o que fazer da vida e quem muito se questiona sempre corre o risco de se indecidir) e cada estudante de psicologia com sua aspiração poderia (na minha mente insana pelo menos, poderia com certeza) fazer rupturas de escolha dentro do curso dignas daqueles corredores clichês de filmes de High School americanos ou de panelinhas de Malhação. A verdade é que a Psicologia é um curso defasado - em dez semestres você sai com um diploma de psicólogo podendo atender em qualquer perspectiva e com conhecimentos básicos (realmente primários, eu arriscaria dizer) sobre todas elas. Ou seja, um diploma vago. O médico que quer ser ortopedista tem que fazer residência, certo? Ele não tem um diploma de corpo humano e sai por aí futucando qualquer parte, certo? Pois um psicólogo pode mexer na sua mente/discurso/comportamento tranquilamente desde que provido de um diploma de psicólogo.
Na minha opinião essa defasagem (no sentido de não obrigatoriedade de uma especificidade na formação) é séria, mas a partir dela eu elaborei uma teoria sobre o lado babaca da psicologia que é muito boa e faria qualquer estudante de psicologia que se leva mais a sério do que o recomendado (que, infelizmente, é uma mania muito aborrecida que as pessoas ao meu redor costumam ter, ou pelo menos os meus antigos colegas da faculdade de jornalismo tinham) me jogar pedras nos comentários.
Bom, na formação final da psicologia, supõe-se que a pessoa tomou duas decisões: uma linha teórica a seguir + um ramo da psicologia para trabalhar. Os ramos são, por exemplo, psicologia analítica (Jung), psicanálise (Freud; Lacan), behaviorismo (Skinner); cognitva (Beck) ou sistêmica (Maturana) enquanto que os ramos de trabalho são, psicologia hospitalar, clínica, escolar, social,organizacional ou carreira acadêmica/ científica. Enfim, cada um pega sua pipoca e seu guaraná e faz seu combo com sal a gosto.
Como cada filosofia teórica se aporta em critérios específicos de estudo, cada uma acaba exigindo um olhar sobre o sujeito. Se, por exemplo, um behaviorista vai se interessar pelas expressões comportamentais do sujeito, um sistêmico vai querer compreender seus sistemas e reverberações (família, por exemplo) enquanto um psicanalista vai se interessar pelo discurso do cliente. Não é tudo a mesma coisa, de verdade. Eu tenho seis amigas que fazem psicologia e eu sou a única que pretende ser psicanalista - pensando sobre isso, sobre que tipo de motivação faz cada pessoa escolher a linha teórica e/ou aplicação prática que vai reger seus caminhos na profissão e me ancorando na richa infantil que rola entre behavioristas e psicanalistas, fiz a teoria mais babaca da psicologia. A teoria da escolha. Não custa muito avisar de novo, para o caso de alguém com algum grau de dislexia estar lendo, que a teoria é uma piada pronta, uma furada, construída em cima do mais alto grau de superficialidade que existe e portanto perfeitamente cabível.
Embora todo mundo ache que psicólogo viaja na maionese, o behaviorista é aquele cara prático, que quer ver o que interessa, resolver com rapidez e normalmente, de fora pra dentro. Ele só acredita em fatos, comprovações e "ciência". O gestaltista é o hippie, que acha que o todo se entrega na parte e a parte no todo e a soma das partes é mais do que o todo ZzZZzz acende o incenso. O psicanalista é o cara mais prepotente de todos, que faz do seu saber uma coisa que ninguém nunca pode alcançar, mas curte viajar na maionese, no de dentro pra fora, analisar um discursinho e analisar toda a teoria através dos reflexos sociais da cultura. As vezes pode sofrer de Freudite e achar que Freud é Deus e tudo que ele falou é ouro.
Essa "teoria das escolhas" é rídicula justamente porque ninguém consegue caber tão bem em um rótulo assim ou ser uma coisa só o tempo todo - já que somos seres sociais e nos construímos através de nossos laços. Ou seja, posso ser muito doce com fulano e extremamente ácida com beltrano, o que importa é que ambos dancemos conforme a música da nossa relação. Ainda assim, confesso que por muito tempo eu levantei essa bandeira anti-behaviorismo por aí, falando que era um saco, coisa de gente superficial e etc, mesmo que eu conheça e ame pessoas que acham que behaviorismo é vida e já decidiram que vão seguir esse caminho. Obviamente eu continuo discordando das raízes teorícas do behaviorismo - porque se opõem a psicanalise e acreditar em opostos nesse caso provavelmente me levaria a loucura, já que, por exemplo, um diz que inconsciente não existe e outro diz que inconsciente é a última fronteira e precisa ser penetrada!
Hoje eu tive aula justamente de behaviorismo, matéria que eu estava devendo, lá no terceiro semestre, com o pessoal verdinho que está começando a ver linhas teóricas e aí eu me dei conta: é bem importante que eu abra cabeça para ouvir de verdade o que aquele professor está falando, posso discordar de tudo, posso não acreditar em nada, mas preciso entender o que é aquilo primeiro, até para discordar, porque meu conhecimento de faculdade vai ser todo o meu conhecimento sobre a linha, já que especializações e derivados eu pretendo fazer no que eu gosto e me interessa. Depois de ter tomado essa decisão, me senti rica de bom senso e renovada para enfrentar o semestre, além de ter me sentido responsável pela construção do meu próprio saber que vai diretamente ser limitado pela minha escolha seguinte: olho o behaviorismo com os olhos críticos de quem quer ser psicanalista e discorda ou olho com olhos de quem não conhece e precisa descobrir? Suponho que devo olhar com o segundo, assim como desejo que as pessoas olhem a minha psicanálise assim, como até vejo os leigos cada vez mais lendo sobre, se interessando sobre, trazendo pra si e cada vez mais vejo os preconceitos das pessoas que estudam psicologia dizendo que psicanálise é falar sozinho num divã ou que não dá pra entender nada do que esses velhinhos diziam. A linha teórica é só uma lupa de aumento pra ver o mundo, cada uma escolhe a sua e sabe se lá porque cada um escolhe o que escolheu. Ou seja, linha teórica é tipo o amor, todo mundo escolhe e ninguém explica embora todo mundo tente.


Sobre a foto: Meu Freud de nariz quebrado (de tanto dar a cara a tapa, talvez?) em cima dos livros com as crônicas semanais do psicanalista Contardo Calligaris na Folha de São Paulo.

2 comentários:

  1. ei ju...

    e andam por ai dizendo, que se alguem for a universidade ou faculdade, e estudar psicologia, saem psicologos... universidade não é circo nem palhaça, mas que faz a magica faz.
    linha teorica é igual a deus, cada um com o seu, deusedorante protege 24 horas, adoro esse... e a linha teorica, a linha que costura, que enrola, que tece, e que, e que, e que... e que encontramos nas prateleiras, pra quem pode pagar a escolha é facil! se tivermos dificuldades, uma analise resolve.

    kaykosanto

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  2. Oi, achei essa postagem sua no google e achei super interessante e bem pertinente para o momento que estou vivendo. Também sou psicóloga e "assino em baixo" em tudo que vc falou sobre sairmos da faculdade apenas com um diploma e uma formação generalista. Tenho 4 anos de formada e me considerava uma behaviorista, apesar de não ter tanta segurança teórica. porém, estou numa fase de namoro com a psicanálise, que tem me respondido algumas questões que o behaviorismo não me respondeu (ou eu não soube entender). Parabéns pela crítica! Me ajudou nessas reflexões... Ainda estou bem confusa qto a linha teórica, mas estou tentando achar um caminho...
    Abraços,
    Tatiana

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